Tirzepatida (Mounjaro) para tratar lipedema: o que a ciência diz
- Dra. Thaísa Bramusse

- há 3 dias
- 5 min de leitura

*Este post é informativo e não tem nenhum interesse comercial.
Se você tem lipedema, já sabe: dieta não funciona direito. Exercício não funciona direito. Até cirurgia bariátrica não resolve o problema das pernas desproporcionais, da dor crônica, do inchaço e dos hematomas que aparecem do nada.
E aí você ouve falar de tirzepatida (Mounjaro), aquele medicamento "milagroso" para emagrecer que todo mundo está comentando. E surge a pergunta: será que funciona a tirzepatida para lipedema?
A resposta honesta? Ainda não temos certeza absoluta. Mas a ciência está MUITO animada com as possibilidades.
Vou te explicar exatamente o que sabemos até agora, com base em estudos científicos recentes, incluindo uma revisão publicada em novembro de 2025 que está mudando a forma como entendemos essa relação.
Primeiro: o que é lipedema (e por que é tão difícil de tratar)?
Lipedema é uma doença crônica do tecido adiposo que afeta até 10% das mulheres no mundo. Não é obesidade nem linfedema, e muito menos "falta de força de vontade".
Características principais:
Acúmulo desproporcional de gordura nas pernas (e às vezes braços);
Dor crônica ao toque;
Hematomas fáceis (roxos que aparecem sem motivo);
Inchaço que piora ao longo do dia;
Resistência a dieta e exercício.
E aqui está o problema: o lipedema não é só "gordura extra". É um ciclo patológico que envolve:
Adipócitos (células de gordura) hipertrofiados e disfuncionais;
Inflamação crônica (macrófagos M1 infiltrados no tecido);
Fibrose intensa (acúmulo de colágeno que endurece o tecido);
Disfunção mitocondrial (células não queimam gordura direito);
Alterações hormonais (predominância de estrogênio beta).
Essa associação resulta em um tecido adiposo "doente", que não responde bem aos tratamentos típicos da gordura convencional.
Por que tirzepatida pode ser diferente?
A Tirzepatida (Mounjaro, Zepbound) não é "só mais um remédio para emagrecer". É um agonista duplo de GLP-1 e GIP, dois hormônios que regulam metabolismo, inflamação e remodelação de tecido adiposo.
E aqui está o ponto crucial: a Tirzepatida ataca exatamente os mecanismos que estão prejudicados no lipedema. Vou te mostrar como:
Mecanismo 1: reduz inflamação crônica
No lipedema, o tecido adiposo está cronicamente inflamado. Macrófagos M1 (células inflamatórias) invadem a gordura e liberam citocinas, substâncias que perpetuam dor, inchaço e fibrose.
O que Tirzepatida faz: estudos mostram que a Tirzepatida age sobre os macrófagos, reduzindo a inflamação, a dor e a progressão da doença.
Uma pesquisa publicada no International Journal of Molecular Sciences (2025) demonstrou que a Tirzepatida reduz citocinas inflamatórias e modula a resposta imune no tecido adiposo, exatamente o que o lipedema precisa.
Mecanismo 2: Combate fibrose (o "endurecimento" do tecido)
Fibrose é o acúmulo excessivo de colágeno e matriz extracelular que torna o tecido rígido, doloroso e resistente. No lipedema, há superexpressão de marcadores fibróticos e ativação de fibroblastos que depositam colágeno sem parar.
O que a Tirzepatida faz: estudos em outras condições fibróticas (esteatohepatite, insuficiência cardíaca) mostram que a Tirzepatida reduz deposição de colágeno, inibe sinalização pró-fibrótica e melhora remodelação da matriz extracelular.
Em outras palavras, a Tirzepatida pode "amolecer" o tecido endurecido do lipedema, reduzindo a dor e melhorando a mobilidade.
Mecanismo 3: restaura função mitocondrial
No lipedema, as mitocôndrias (usinas de energia das células) estão disfuncionais. Elas produzem excesso de radicais livres, causam estresse oxidativo e não conseguem queimar gordura adequadamente.
O que a Tirzepatida faz: aumenta a expressão de uma proteína que ativa termogênese, ou seja, faz o tecido adiposo queimar gordura para gerar calor.
Além disso, melhora eficiência mitocondrial e reduz estresse oxidativo. Com isso, as células de gordura voltam a funcionar, ao invés de só acumular.
Mecanismo 4: regula hormônios (especialmente estrogênio)
O lipedema está intimamente ligado a desequilíbrios hormonais. Há dois problemas principais: primeiro, as células de gordura respondem mais ao 'tipo beta' de estrogênio (que piora inflamação) do que ao 'tipo alfa' (que seria mais protetor).
Segundo, a própria gordura produz estrogênio extra por meio de uma enzima chamada aromatase, ou seja, quanto mais gordura, mais hormônio, mais inflamação, mais lipedema.
O que a Tirzepatida faz: embora não atue diretamente em receptores de estrogênio, a Tirzepatida melhora a sensibilidade à insulina e regula metabolismo hormonal, o que pode indiretamente modular a sinalização estrogênica no tecido adiposo.
E na prática? Tem algum estudo em humanos com lipedema?
Aqui está a verdade honesta: ainda não existem ensaios clínicos grandes e controlados testando a Tirzepatida especificamente para lipedema.
Mas (e isso é importante) temos evidências preliminares MUITO promissoras:
Relato de caso (outubro 2025):
Publicado no Journal of the Endocrine Society, descreveu uma paciente com lipedema que usou dose baixa de Tirzepatida por 30 dias e teve:
Remissão completa da dor;
Melhora da textura da pele;
Redução do inchaço.
Os autores concluíram: "Tirzepatida parece reduzir a carga inflamatória no lipedema, mas são necessários ensaios clínicos para validar."
Revisão científica de 2025:
A revisão mais completa até agora foi publicada em novembro de 2025 no International Journal of Molecular Sciences por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).
Principais conclusões:
A Tirzepatida tem plausibilidade biológica forte para tratar lipedema;
Atua em múltiplos alvos patogênicos: inflamação, fibrose, disfunção mitocondrial, remodelação adiposa;
Pode ser terapia modificadora de doença (não só sintomática);
Urgentemente necessário: ensaios clínicos dedicados.
Citação dos autores:
"Se estudos clínicos futuros confirmarem esses mecanismos, a Tirzepatida pode representar uma terapia metabólico-hormonal capaz de modificar o curso natural do lipedema."
Tirzepatida está aprovada para lipedema?
NÃO. A Tirzepatida está aprovada apenas para:
Diabetes tipo 2;
Obesidade.
Então, devo usar tirzepatida para lipedema?
Essa é uma decisão MÉDICA, individualizada. Considere a Tirzepatida se:
Você tem lipedema confirmado (diagnóstico médico);
Você também tem obesidade ou sobrepeso;
Você já tentou tratamentos convencionais sem sucesso;
Seu médico concorda e acompanhará seu tratamento.
NÃO use a Tirzepatida se:
Você está grávida ou amamentando;
Você tem histórico de pancreatite ;
Você tem alergia ao medicamento;
Você espera "cura milagrosa" sem acompanhamento.
Outros tratamentos para lipedema (enquanto esperamos mais estudos)

A Tirzepatida é promissora, mas não é a única opção. o tratamento de lipedema é multidisciplinar e temos conseguido excelentes resultados aqui no Instituto Bramusse:
Terapia de compressão;
Meias de compressão reduzem inchaço
Drenagem linfática manual: melhora circulação e reduz edema;
Exercício físico orientado: baixo impacto, melhora mobilidade e a composição corporal
Alimentação anti-inflamatória: reduz inflamação sistêmica;
Lipoaspiração tumescente: remove tecido adiposo doente (cirúrgico);
Suplementação adequada.
Lipedema não tem cura definitiva (ainda), mas tem controle e melhora de qualidade de vida.
Conclusão: a esperança baseada em ciência, não em hype
A Tirzepatida para lipedema não é comprovado ainda. Mas é extremamente promissor e já existem evidências robustas.
A ciência mostra que ela ataca exatamente os mecanismos que fazem o lipedema ser tão resistente: inflamação, fibrose, disfunção mitocondrial, desregulação hormonal.
Relatos de caso mostram melhora dramática de sintomas. Revisões científicas pedem urgentemente ensaios clínicos.
Até lá, converse com seu médico. Se você tem lipedema e obesidade, a Tirzepatida pode ser opção off-label (uso fora da bula, mas com base científica).
Um abraço,
Dra. Thaísa Bramusse
CRM 50.338






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